Direito Civil - Responsabilidade Civil - Cliente que teve queda em esteira rolante de supermercado deve ter reparação material e moral, conforme decisão do Tribunal de Justiça, que majorou indenização estabelecida em primeira instância.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao apelo e dar parcial provimento ao recurso adesivo.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores DESA. ÍRIS HELENA MEDEIROS NOGUEIRA E DES. ODONE SANGUINÉ.
Porto Alegre, 26 de outubro de 2005.
DES. LUÍS AUGUSTO COELHO BRAGA,
Relator.
RELATÓRIO
DES. LUÍS AUGUSTO COELHO BRAGA (RELATOR)
Adoto o relatório de fl. 68 e seguintes, que passo a transcrever:
“FULANO ajuizou AÇÃO DE INDENIZAÇÃO contra SUPERMERCADO S.A., ambos qualificados na inicial, relatando que após efetuar suas compras no SUPERMERCADO S.A., dirigiu-se ao estacionamento através da esteira rolante. No entanto, tal equipamento teria apresentado defeito, fazendo com que o carrinho se desprendesse e precipitasse esteira abaixo juntamente com o autor. Este foi lançado violentamente contra a esteira metálica, lesionando diversas partes do corpo, dentre elas o rosto, boca, dentes, pernas, etc. Aduziu que nenhum auxílio foi prestado pela demandada, tendo registrado ocorrência policial e realizado exame de corpo de delito. Em decorrência, informa ter sido submetido a cirurgia para reposição de dente, necessitando de fisioterapias e cirurgias, acumulando despesas inclusive com medicamentos.
Destaca que além do dano material sofreu abalo na esfera moral, decorrentes da dor e constrangimento a que foi submetido. Requereu a procedência da ação, condenando a ré ao pagamento do dano material na quantia de R$ 1.397,49, acrescido de juros e correção monetária a contar do desembolso, bem como dos custos de fisioterapia e cirurgias plásticas a que terá de submeter-se. Requereu igualmente o pagamento de indenização por dano moral, no equivalente a 200 salários-mínimos. Postulou AJG, deferida à fl. 53.
A requerida, regulamente citada (fl. 61), deixou fluir o prazo contestacional ‘in albis’.”
Adveio sentença que julgou procedente a ação, condenando a ré ao pagamento, a título de danos materiais, da quantia de R$ 1.397,49, devidamente atualizada. Condenou, também, ao pagamento de R$ 6.500,00 referente ao dano moral e ao ressarcimento dos valores que forem gastos em fisioterapia e cirurgia plástica, em liquidação de sentença por artigos.
Inconformado com a sentença apelou SUPERMERCADO S.A. requerendo a reforma da sentença, pois destoante do conjunto probatório. Destaca que os danos materiais já foram quitados com a apelada, pois o recibo juntado ao processo pelo autor demonstraria o pagamento havido. Aponta que os danos morais não restaram comprovados, sendo que era ônus do apelado tal comprovação. Disse que deve ser reconhecida a culpa concorrente, importando em minoração da condenação. Alega que não estão comprovados os requisitos ensejadores da indenização por dano moral. Destaca que houve prestação do socorro por parte de apelante, quando do acidente, sendo que o apelado firmou recibo, face pagamento espontâneo, dando quitação dos danos materiais e eventuais danos morais. Esclareceu que os juros aplicados na sentença não podem ser de 12% ao ano, mas sim de 1% ao mês. Por fim, requereu o provimento de seu apelo para que seja afastada a condenação, ou minorada esta.
Inconformado, também, com a sentença FULANO apresentou recurso adesivo, requerendo a majoração da condenação para 100 salários mínimos.
Na mesma senda, apresentou contra-razões à apelação interposta, onde destacou que a apelante compareceu ao feito apenas para causar confusão, trazendo inverdades, razão pela qual requereu a aplicação das penalidades de litigância de má-fé.
Foi apresentada resposta ao recurso adesivo.
É o relatório.
VOTOS
DES. LUÍS AUGUSTO COELHO BRAGA (RELATOR)
Passo a apreciar o recurso apresentado por SUPERMERCADO S/A.
Prescreve o art. 330, II, do CPC que o juiz conhecerá diretamente do pedido quando ocorrer a revelia. O art. 319 diz que: “Se o réu não contestar a ação, reputar-se-ão verdadeiros os fatos afirmados pelo autor.”
É certo, pois, que a revelia gera a presunção relativa de veracidade dos fatos articulados na petição inicial ex vi do art. 319 do CPC, sendo que tal presunção cede somente quando evidenciada a falta de razoabilidade de alguma afirmação da exordial ou quando colide com algum elemento de convicção existente nos autos. Mas isso não ocorre.
Diante desse contexto, ante à confissão ficta, decorrente da revelia da demandada e, ainda, não se verificando quaisquer das hipóteses previstas no art. 320 do CPC, devem ser reputados verdadeiros os fatos alegados na peça inicial, especialmente em relação ao não pagamento dos danos materiais, já que o recebi juntado pelo autor não está assinado e ante a declaração de que o mesmo foi um meio de coação para o apelado abrir mão de sua possível indenização por dano moral. A propósito, destaco que se tratando de relação de consumo, incumbia à ré demonstrar que pagou os danos materiais e que não houve o dano alegado, ônus do qual não se desincumbiu por livre e espontânea vontade.
Ressalta-se, ademais, que ao contrário do sustentado pela apelante em suas razões, não se verifica a culpa concorrente do autor pelo evento danoso.
Por outro lado, não vinga a tese de inexistência de provas do dano moral, porquanto não se exige que a vítima comprove a dor, o constrangimento e o abalo moral de forma efetiva, sendo suficiente a demonstração do fato gerador do alegado dano. Nos casos em que verificada a excepcionalidade e a gravidade da ofensa, o dano moral é puro, prescindindo de prova da ocorrência de prejuízo concreto, o qual se presume, conforme as regras de experiência comum (art. 335 do CPC).
Quando a alegação de que os juros fixados em 12% ao ano estão em desacordo com o disposto no Código Civil, devendo estes ser de 1% ao mês, tenho que tal alegação tangencia a má-fé, já que 1% ao mês é o mesmo que 12% ao ano.
Assim, nego provimento ao apelo interposto.
Passo a apreciar o recurso adesivo.
O valor da indenização a ser determinado pelo Julgador deve levar em conta: as condições econômicas e sociais da empresa ofensora – no caso, instituição comercial de porte; a gravidade da falta cometida – falta de segurança em serviço oferecido ao consumidor; e as condições do ofendido – aposentado litigando sob AJG; não devendo a verba enriquecê-lo ilicitamente, nem causar constrangimento econômico à empresa-ré, sem perder de vista o caráter punitivo-pedagógico.
Ademais, entendo deva a indenização estar alinhada ao entendimento dominante desta Colenda Câmara para a espécie, conforme ementa, entre tantas, ora transcrita:
“INDENIZAÇÃO. PEDIDO DE DANOS MORAIS E MATERIAIS. FRATURA DE FÊMUR DECORRENTE DE QUEDA EM SUPERMERCADO. PRESENÇA DOS PRESSUPOSTOS DO DEVER DE INDENIZAR. ARTS. 8º, 12 E 13 DO CDC. NEXO CAUSAL E FRATURAS CLARAMENTE COMPROVADAS PELO LAUDO DO PERITO. REDUÇÃO DO VALOR ARBITRADO PARA OS DANOS MORAIS. AGRAVO RETIDO DESPROVIDO. I. AGRAVO RETIDO DESPROVIDO. A testemunha que segue mantendo vínculo empregatício com uma das partes da relação processual, ou seja, continua atuando no mesmo local e exercendo a mesma função, não deve ser compromissada, ainda que tenha havido sucessão de empregadores, pois seu patrão originário vendeu o grupo econômico para outra empresa. Acontece que, na hipótese dos autos, os termos desta sucessão de empresas não foi devidamente esclarecido e, em sendo assim, persiste o temor decorrente da hierarquia funcional a prejudicar seu testemunho. II. DOS FATOS. A hipótese dos autos diz com a situação de uma consumidora (apelada), que fazia compras num supermercado (apelante), na seção de hortifrutigranjeiros, quando escorregou em alguma coisa e caiu no corredor do estabelecimento comercial. Como conseqüência deste evento, a apelada sofreu fratura de fêmur e outra série de prejuízos. À vista do teor dos fatos e provas dos autos, resultou configurada a responsabilização objetiva da apelante pela falha na prestação do serviço de supermercado, por descumprimento do dever de segurança, na forma preconizada pelos artigos 8, 12, 13 e 14 do CDC. III. DOS DANOS POSTULADOS. No caso dos autos, reconheço ambos os pedidos: danos materiais e danos morais, porquanto ambos ficaram cabalmente comprovados nos autos do processo. IV. DO NEXO CAUSAL. Em se tratando de dano moral puro, o prejuízo é imaterial e - por conta disto - encontra-se ínsito na ofensa. Assim, basta a prova do ato ilícito que se presumirão os alegados danos morais puros. Por outro lado, no que diz respeito aos danos materiais, a perícia médica foi clara ao reconhecê-los e admitir a versão dos fatos apresentados pela autora. V. DO ARBITRAMENTO DOS DANOS MORAIS. A verba indenizatória deve ser arbitrada em conformidade com os critérios objetivos e subjetivos do caso concreto, observados os parâmetros adotados pela jurisprudência desta Câmara, bem assim os do STJ, mas, essencialmente, deve buscar a compensação da vítima, evitando enriquecê-la indevidamente. No caso dos autos, à vista de todos estes critérios, impõe-se a redução do arbitramento realizado pelo juízo de primeiro grau, relativamente aos danos morais, pois considero que 80 (oitenta) salários mínimos não condiga com o bom senso e a razoabilidade. Portanto, reduzo-os para 50 (cinqüenta) salários mínimos. VI. MANTIDA A FIXAÇÃO DA SUCUMBÊNCIA NA FORMA PREVISTA PELO ART. 21, CAPUT DO CPC. AGRAVO RETIDO DESPROVIDO. RECURSO DE APELAÇÃO PROVIDO EM PARTE. (Apelação Cível Nº 70009496605, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Iris Helena Medeiros Nogueira, Julgado em 15/09/2004)”
Assim, atento aos aspectos antes referidos e ao precedente desta Colenda Câmara, verifico que a indenização fixada pelo Magistrado – R$ 6.500,00 – ficou aquém dos parâmetros adotados por este Colegiado, razão pela qual dou parcial provimento ao recurso, para majorar a indenização para cinqüenta (30) salários mínimos nacionais, os quais deverão ser convertidos em reais na data deste acórdão, devendo o valor ser corrigido pelo IGP-M até a data do efetivo pagamento, incidindo, ainda, sobre a verba, juros de mora à taxa legal de 12% a.a., contados da data do evento danoso, na forma da Súmula nº 54, do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, mantidas as demais cominações da sentença recorrida.
Assim, dou parcial provimento ao recurso adesivo.
Deixo de aplicar as penas de litigância de má-fé, eis por que não vislumbro qualquer causa permissiva apesar de a empresa-ré ter chegado ao limite da legalidade em seu recurso, porém creio que tal advenha de mera tentativa de oferecer defesa ao feito, já que como revel não pode apresentar as alegações pretendidas.
É o voto.
DESA. ÍRIS HELENA MEDEIROS NOGUEIRA (REVISORA) - De acordo.
DES. ODONE SANGUINÉ - De acordo.
Apelação Cível n.º 70012528287, de PORTO ALEGRE – A decisão é a seguinte: “NEGARAM PROVIMENTO AO APELO E DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO ADESIVO. UNÂNIME”.
Julgador(a) de 1º Grau: KATYA ZIEDE COELHO LEAL
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