Caminhoneiro - Horas Extras, Diferenças Salariais e Descontos

Direito do Trabalho - Caminhoneiros - Reconhecida a remuneração em forma de comissões a base de 10% e seus reflexos, condenada a empresa a restituir descontos de 5% sobre o valor do frete, negado pedido de horas extras a despeito dos tacógrados e contato por rádio.

Aos ... dias do mês de ... de ..., na sala de audiências da ... Vara do Trabalho de ... - ..., estando presente o Exmo. Juiz do Trabalho ... foi realizada audiência relativa ao Processo nº ... entre partes FULANO e TRANSPORTES LIMITADA, reclamante e reclamada, respectivamente.

Aberta a audiência às ...h..., por ordem do MM. Juiz do Trabalho Substituto no exercício da Presidência foram apregoadas as partes, que não se fizeram presentes.

Em seguida foi proferida a seguinte sentença.


I – RELATÓRIO
FULANO, devidamente qualificado nos autos do processo em epígrafe, propôs reclamação trabalhista em face de TRANSPORTES LIMITADA, igualmente identificada, alegando ter trabalhado de 02.02.2000 a 17.12.2004, na função de motorista carreteiro. Foi dispensado sem justa causa. Recebia salário fixo no valor de R$ 600,00, acrescido de comissões de 10% sobre o valor do frete e diárias, totalizando a importância média de R$ 4.380,00. Trabalhava todos os dias, vinte e quatro horas por dia. Fez os pedidos elencados às fls. 06/08. Emenda da inicial às fls. 26/29.

Deu à causa o valor de R$ 1.463.099,71 (um milhão, quatrocentos e sessenta e três mil, noventa e nove reais e setenta e um centavos).

A inicial veio acompanhada de procuração (f. 10) e documentos (fls. 11/22).

Regularmente notificada (fls 25 e 37), a reclamada compareceu à audiência inaugural. Recusada a proposta conciliatória inicial, foi apresentada defesa escrita acompanhada de documentos (fls. 39/94). Impugnação do reclamante às fls. 96/106.

Na audiência de instrução (fls. 121/123), foram tomados os depoimentos da reclamante, do representante da reclamada e de três testemunhas, duas do autor e uma da ré.

Razões finais remissivas pelas partes.

Rejeitada a última proposta conciliatória.

É, em síntese, o relatório.

Decido.


II – FUNDAMENTAÇÃO

PRELIMINARES
1. incompetência absoluta da Justiça do Trabalho - Acidente de Trabalho

O reclamante pediu a condenação da reclamada no pagamento de indenização por danos morais e materiais decorrentes de acidente de trabalho (estouro de pneu). Por se tratar de matéria de ordem pública, conheço de ofício desta questão (CPC, artigo 301, inciso II).

Atualmente, é grande a celeuma criada acerca da competência da Justiça Laboral para conhecer e julgar as lides envolvendo indenização por acidente de trabalho. Com respeito aos que entendem de forma diversa, tenho que esta Justiça é incompetente para conhecer essas lides.

O artigo 114 da Constituição da República que estabelece a competência da Justiça do Trabalho para julgar todas as demandas decorrentes da relação de emprego deve ser interpretado em conjunto com os demais dispositivos nela constantes, em especial, com o
art. 109, I, cujo conteúdo é o seguinte:

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:
I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidente de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;

Destarte, uma simples análise do art. 114 da CR pode levar o intérprete a concluir pela competência desta Justiça para o julgamento das causas decorrentes de acidente de trabalho, uma vez que referidas lides são originadas de uma relação de emprego.

Contudo, ao tratar da competência dos juízes federais, o art. 109, I, atribui a eles a competência para julgar todas as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem, de um modo geral, interessadas, excepcionando, porém, dentre outras, as relativas aos acidentes de trabalho e às sujeitas à Justiça do Trabalho.

Ora, se o legislador constituinte, ao excepcionar as lides que não se compreendem dentre aquelas afetas aos juízes federais, tratou de modo diverso às de acidente de trabalho e aquelas sujeitas à Justiça do Trabalho, logicamente tem-se que as primeiras não estão incluídas nas segundas. Pois, caso contrário, não haveria razão para essa diferenciação. Há que se ter em mente que a Lei não contém palavras inúteis.

Essa matéria encontra-se pacificada no Superior Tribunal de Justiça, inclusive, com a edição da Súmula n. 15: Compete à Justiça Estadual processar e julgar os litígios decorrentes de acidente de trabalho. Seguindo essa orientação o Tribunal de Justiça de Mato Grosso tem, reiteradamente, decidido pela competência da Justiça Comum, como se verifica do julgamento abaixo transcrito:

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MO-RAIS - ACIDENTE DE TRABALHO - COMPETÊNCIA DE-CLINADA PARA A JUSTIÇA DO TRABALHO - INADMISSI-BILIDADE - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM - AGRA-VO PROVIDO - DECISÃO REFORMADA - À UNANIMIDADE.
Compete à justiça comum processar e julgar ação de indenização decorrente de acidente de trabalho (Terceira Câmara Cível - Recurso de Agravo de Instrumento n. 32897/2002 - Classe II - 15 - Comarca Capital - Data do Julgamento: 13.11.2002).

Reconheço que o TRT da 23ª. Região já decidiu pela competência da Justiça do Trabalho para conhecer essas lides, contudo, me permito discordar desse entendimento. Por se tratar de matéria constitucional a palavra final será dada pelo Supremo Tribunal Federal, o qual, por várias vezes já decidiu pela incompetência da Justiça Laboral.

Recentemente, o STF, em manifestação do Pleno, decidiu pela competência da Justiça Comum.

Anteriormente, a Segunda Turma do STF, no acórdão publicado em 07.10.2003 (RE 345.486-2), por unanimidade, em julgamento de relatoria da Ministra Ellen Gracie, já havia confirmado a competência da Justiça Comum para o julgamento das lides referentes a acidente de trabalho. Transcrevo a ementa do julgamento:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PROCESSO CIVIL. DEMAN-DA SOBRE ACIDENTE DE TRABALHO. COMPETÊNCIA. ART. 109, I DA CONSTITUIÇÃO. 1. Esta Suprema Corte tem assentado não importar, para a fixação da competência da Justiça do Trabalho, que o deslinde da controvérsia dependa de questões de direito civil, bastando que o pedido esteja lastreado na relação de emprego (CJ 6.959, rel. Min. Sepúlveda Pertence, RTJ 134/96). 2. Constatada, não obstante, a hipótese de acidente de trabalho, atrai-se a regra do art. 109, I da Carta Federal, que retira da Justiça Federal e passa para a Justiça dos Estados e do Distrito Federal a competência para o julgamento das ações sobre esse tema, independentemente de terem no pólo passivo o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS ou o empregador. 3. Recurso extraordinário conhecido e improvido.

Mesmo após a Emenda Constitucional n. 45 o Supremo Tribunal Federal tem mantido seu entendimento quanto a incompetência da Justiça do Trabalho para o julgamento das lides decorrentes da relação de emprego.

Portanto, esta Justiça Especializada é incompetente para conhecer, processar e julgar o feito quanto ao pedido de indenização de danos moral e estético decorrente do acidente de trabalho.

Não havendo como cindir o processo para remessa a Justiça Comum, determino a extinção do processo sem exame do mérito, relativamente ao pedido de indenização de danos morais decorrente do acidente do trabalho, com base no artigo 267, IV, do CPC.


2. inépcia da petição inicial - jornada extraordinária - ausência de controle
A reclamada argüiu a preliminar de inépcia da petição inicial do pedido de horas extras sob o fundamento de ausência de controle da jornada de trabalho. Sem razão, contudo.

Contrariamente do alegado pela reclamada, o reclamante na petição inicial afirmou a existência de controle de sua jornada de trabalho, o qual era exercido por meio de tacógrafo, rádio PX e ordens de serviço (f. 03).

A ocorrência, no caso concreto, da existência da excludente prevista no artigo 62 do CPC é questão de mérito e nele será analisada.

Rejeito a preliminar.


3. inépcia da petição inicial - adicional de periculosidade
Prejudicada a análise da preliminar em face da renúncia ao pedido de periculosidade (f. 123).


4. inépcia da petição inicial - devolução dos descontos ilegais
A reclamada argüiu a preliminar de inépcia do pedido de devolução dos descontos ilegais sob a alegação de inexistência de causa de pedir.

Razão não lhe assiste.

Não petição inicial o reclamante narrou que desde o início de seu contrato de trabalho, a Reclamada passou a descontar do frete bruto, a importância de 5% (cinco por cento) alegando que é para o INSS, reduzindo assim o salário comissivo do reclamante. Em seguida pediu a restituição dos descontos indevidos da porcentagem de 5% sobre o valor bruto dos fretes que a Reclamada alega ser p/ INSS.

Destarte, estão perfeitamente discriminados na inicial a causa de pedir e o pedido.

Rejeito a preliminar.

Diferentemente, razão assiste à reclamada quanto ao pedido contido à f. 07, alínea v (Restituição de todos os descontos indevidos contidos nos disquetes de Caixa 2 já requeridos, conforme perícia contábil). Não há na inicial a descrição de qualquer fato justificando a elaboração desse pedido.

Sendo assim, declaro inepto o pedido contido à f. 07, alínea v, da exordial, conseqüentemente julgo extinto o processo sem análise de mérito.


5. impossibilidade jurídica do pedido - dobra das verbas incontroversas
A reclamada argüiu a preliminar de impossibilidade jurídica do pedido de pagamento em dobro das verbas incontroversas sob o argumento de inexistência de previsão legal.

Embora o artigo 467 da CLT preveja a multa de 50% em caso de não pagamento das verbas rescisórias incontroversas em primeira audiência, tal fato não implica na impossibilidade jurídica do pedido da quitação em dobro, mas sim na improcedência do pedido.

Indefiro.


6. impossibilidade jurídica do pedido - incorporação das diárias
Os argumentos elencados pela reclamada sob esse tópico são de mérito.

Rejeito a preliminar.


MÉRITO
1. data de admissão/função

Divergiram as partes no tocante a data de admissão. O reclamante afirmou ter sido contratado em 02.02.2000. A reclamada negou essa data, afirmando que o início do contrato de trabalho ocorreu em 01.06.2000.

Negada a prestação de serviços ao autor cabia o ônus de prová-la.

Questionado, o reclamante informou que não se lembra o dia e mês, mas iniciou a prestação de serviço em 2002....

O desconhecimento do reclamante no tocante aos fatos relacionados ao seu contrato de trabalho, especificamente quanto à data de admissão, implica em confissão, razão pela qual prevalece a data de admissão anotada em sua carteira de trabalho (01.06.2000).

A função exercida pelo reclamante foi de motorista. Não restou comprovado nos autos o exercício da função de frentista.


2. salário
O autor aduziu, na inicial, que no ato da contratação foi pactuado o pagamento da importância fixa de R$ 600,00 acrescida da comissão equivalente a 10% sobre o valor bruto do frete (no valor médio de R$ 3.000,00) e diárias no valor de R$ 780,00, totalizando R$ 4.380,00. A reclamada informou o pagamento do valor fixo acrescido de comissões de 0,8% sobre o valor do frete.

A CLT, no seu artigo 464, disciplinou a forma como deve ser feito o pagamento de salário: O pagamento de salário deverá ser efetuado contra recibo, assinado pelo empregado.... Cumprindo essa disposição legal, a reclamada juntou aos autos os documentos de fls. 77/94, portanto, ao reclamante competia o ônus de comprovar que os recibos de pagamento de salários não correspondiam à realidade.

Em seu depoimento pessoal, o autor afirmou que recebia 10% do valor bruto do frete... realizava um total de frete de R$ 28.000,00, recebendo 10% desse valor... o valor efetivamente recebido pelo depto era em torno de R$ 1.700,00/1.800,00 por mês... havia essa diferença porque a empresa exigia que o depte fizesse uma média de 2,45Km por litro de combustível, como o reclamante não atingia essa média, a empresa descontava a importância respectiva... recebia exclusivamente comissões... o salário fixo constante na carteira era pago ao reclamante mas era descontado do valor das comissões... no ato da contratação foi combinada a comissão de 10% que nos últimos 16 meses a empresa passou a fazer o desconto de 05% sobre o valor total de frete para efeito de cálculo das comissões.... (f. 121). Essas informações foram confirmadas por suas testemunhas.

- BELTRANO (f. 122): ... recebia o salário fixo da categoria acrescido de 10% do valor bruto do frete.... produzia em média cerca de R$ 28.000,00 por mês... somente no primeiro mês o depte recebeu salário fixo acrescido de comissões, nos demais recebeu apenas comissões... durante todo o contrato de trabalho do depte a empresa descontava sempre 05% do valor total do frete para só então calcular a comissão de acordo com o percentual acima noticiado... não recebia diárias... não sabe informar o valor total de frete produzido pelo recte.

- SICRANO (f. 122): ...recebia 10% sobre o valor bruto do frete... havia contratado um salário fixo na carteira, mas esse não era pago, ou seja, era pago e descontado do valor das comissões...perguntado se havia algum desconto respondeu que apenas do salário de carteira... perguntado se havia desconto de 05%, respondeu que sim, que era o imposto... esse percentual era descontado sobre o valor do frete, par logo após ser calculada a comissão segundo os percentuais anteriormente descritos...

Restou demonstrado que o salário pago pela empresa era exclusivamente composto de comissões no percentual de 10% sobre o valor bruto do frete. Não havia o pagamento de salário fixo. Não havia o pagamento de diárias.

A testemunha da reclamada LARISSA confirmou o salário descrito na defesa, contudo, soube informar o salário do reclamante através da análise das folhas de pagamento. Portanto, as informações por ela prestadas em nada ajudam a solução da controvérsia.

No Direito do Trabalho vige o princípio da primazia da realidade. Não se trata de negar valor à prova documental, mas sim atribuir a ela valor relativo. Comprovado que os documentos não refletem à realidade, disso emerge sua nulidade. Em caso semelhante, este Tribunal já decidiu:

PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DA REALIDADE - No Direito do Trabalho, prevalece sempre o Princípio da Primazia da Realidade, carecendo de qualquer valor jurídico expedientes engendrados com o escopo de ocultar a relação de emprego, mesmo que tais expedientes estejam acobertados por aparente legalidade, à medida que o artigo 9º da CLT comina a nulidade a todos os atos simulados tendentes a obstar a aplicação das leis de proteção ao trabalho. Conforme ensinamentos de Américo Plá Rodrigues, O que interessa é determinar o que ocorra no terreno dos fatos, o que poderia ser provado na forma e pelos meios de que se disponham em cada caso. Porém demonstrados os fatos, eles não podem ser contrapesados ou neutralizados por documentos ou formalidades. Recurso a que se nega provimento. (TRT 23ª. R. - RO 0150/2000 - Acórdão N. TP. n. 1519/2000 - Relator Juiz Nicanor Fá-vero).

Destarte, declaro nulos os recibos de pagamento trazidos aos autos. Declaro que a remuneração do reclamante era composta, exclusivamente, de comissões no percentual de 10% sobre o valor bruto do frete.

Não houve pactuação de salário fixo. Não houve a pactuação de diárias. A empresa não efetuava o pagamento de diárias. Era o próprio trabalhador quem arcava com essa despesa. Ressalto, que o juiz deve ficar adstrito ao pedido e a causa de pedir. A inicial pede a integração das diárias ao salário por ter havido pactuação desse valor, o que efetivamente não ocorreu.

Quanto à média recebida pelo reclamante, não há prova nos autos de ter produzido R$ 28.000,00 por mês. As testemunhas não souberam informar esse fato. Destarte, prevalece o valor declarado pelo preposto da reclamada em seu depoimento pessoal (R$ 20.000,00 por mês), perfazendo o salário médio de R$ 2.000,00, equivalente à comissão de 10% sobre o valor bruto do frete.

Diante do exposto, condeno a reclamada a proceder, no prazo de 05 dias, sob pena da Secretaria fazê-lo, a retificação na CTPS do obreiro para constar o salário exclusivamente composto de comissões de 10% sobre o valor bruto do frete, as quais atingiam a média de R$ 2.000,00 mensais.

Tendo em vista que o reclamante recebia exclusivamente co-missões, condeno a reclamada no pagamento do descanso semanal remunerado. Para o cálculo dessa verba deverá ser divido o valor das comissões recebidas no mês pela quantidade de dias úteis, multiplicando-se, em seguida, pela quantidade de DS-Rs e feriados do referido mês.

Reconhecido salário superior àquele anotado na CTPS do re-clamante, condeno a reclamada no pagamento das diferenças incidentes sobre as férias acrescidas de 1/3, gratificação natalina, aviso prévio indenizado, depósitos do FGTS e multa de 40%.

Indefiro o saldo de salário fixo e saldo de diárias, bem como seus reflexos nas demais verbas.


3. devolução dos descontos de 5% sobre o total do frete
De acordo com as informações prestadas pelo reclamante e as testemunhas, extraio dos depoimentos que a reclamada efetuava o desconto de 5% sobre o valor total do frete para em seguida calcular as comissões do trabalhador.

Esse procedimento não encontra amparo no ordenamento jurídico e constitui-se em fraude aos direitos do reclamante.

Destarte, condeno a reclamada na devolução dos valores indevidamente descontados do reclamante. Explico a forma como devem ser feitos os cálculos dos valores a serem restituídos.

Restou comprovado que a reclamada efetuava o desconto de 5% sobre o total do frete bruto produzido pelo reclamante. Foi reconhecido nesta sentença que a média da produção do obreiro era de R$ 20.000,00. Então sobre esse valor a reclamada deduzia o percentual de 5% (R$ 20.000,00 - 5% = R$ 19.000,00), em seguida aplicava o percentual de 10% para o cálculo das comissões (R$ 19.000,00 x 10% = R$ 1.900,00). O correto seria aplicar o percentual de 10% sobre o total do frete (R$ 20.000,00 x 10% = R$ 2.000,00).

Destarte, a importância a ser restituída ao reclamante equivale a R$ 100,00 mensais, referente ao percentual de 5% deduzido sobre o total do frete.


4. jornada de trabalho
O reclamante alegou que trabalhava todos os dias, vinte e quatro horas por dia. Tinha jornada de trabalho controlada por tacógrafo, rádio PX e ordens de serviço. A reclamada negou o direito às horas extras sob o fundamento do exercício de atividade externa, incompatível com o controle de jornada.

Sobre a questão, o reclamante relatou em seu depoimento pessoal (f. 121):

:... tinha sua jornada de trabalho controlada por rádio-PX... a empresa entrava em contato com o recte por meio do rádio de 02 a 03 vezes por dia... não havia horário determinado para que a empresa entrasse em contato com o recte por meio do rádio, o que era feito segundo as necessidades.... a empresa também controlava o horário de saída de sua sede e chegada neste local... em média demorava em cada viagem 02 dias... não tinha controle do horário de almoço e término da jornada, mas muitas vezes o depte almoçou conduzindo o veículo ... fazia viagem para fora do Estado... essas viagens demoravam cerca de 08 dias...

Constato das informações prestadas pelo reclamante a ausência de controle de jornada. Não havia o controle do horário de almoço ou término da jornada. O contato por meio do rádio PX não tinha a finalidade de controle de horário, pois ocorria segundo as necessidades. Quanto ao horário de saída/chegada na sede da empresa, impossível considerar esse fato como controle de jornada, pois as viagens duravam dois dias (quando viajava para outro Estado, durava cerca de 08 dias). E, finalmente, o tacógrafo não se presta para controlar a jornada de trabalho, conforme entendimento consubstanciado na OJ 332/SBDI 1:

MOTORISTA. HORAS EXTRAS. ATIVIDADE EXTERNA. CONTROLE DE JORNADA POR TACÓGRAFO. RESOLUÇÃO Nº 816/1986 DO CONTRAN.O tacógrafo, por si só, sem a existência de outros elementos, não serve para controlar a jornada de trabalho de empregado que exerce atividade externa.

Sendo assim, constato que atividade desenvolvida pelo reclamante (motorista carreteiro) afasta qualquer tipo de controle de jornada, razão pela qual não faz jus a horas extras.

MOTORISTA - TRABALHO NÃO SUBMETIDO A CONTROLE DE HORÁRIO – O motorista-carreteiro que realiza viagens de longo curso e que não está submetido a sistema de controle direto ou indireto de horário, enquadra-se à exceção do art. 62, letra a, da CLT, não fazendo jus à percepção de horas extras. (TRT 9ª R. - RO 10.543/94 - 3ª T. - Ac. 14.290/95 - Rel. Juiz Euclides Alcides Rocha)

HORAS EXTRAORDINÁRIAS. MOTORISTA. TRABALHO EXTERNO. A sobrejornada, por caracterizar-se como fato extraordinário à regra contratual, necessita ser amplamente
provada. Em se tratando de trabalho externo, para seu deferimento, deverá haver, obrigatoriamente, prova da existência de controle de jornada. Recurso Ordinário ao qual se nega provimento. (TRT 23ª. R. - RO 01303.2002.021.23.00-5 - Rel. Juiz Bruno Weiller).

Sendo assim, indefiro o pedido de horas extras. Rejeitado o principal (horas extraordinárias) o mesmo ocorre com o acessório (reflexos).

A ausência do controle de horário implica no indeferimento dos pedidos de horas extras, intervalo intrajornadas, adicional noturno e períodos de descanso, pois abrange todas as disposições do Capítulo II, do Título II da CLT.


5. devolução da importância de R$ 400,00 efetivada no TRCT
O reclamante requereu a restituição do valor de R$ 400,00, alegando ter sido indevidamente descontado na rescisão contratual, conforme documento de f. 30.

A reclamada não contestou esse pedido.

Sendo assim, condeno a reclamada na devolução dessa importância sob pena de execução.


6. contribuições previdenciárias
A reclamada deverá comprovar nos autos o recolhimento da contribuição previdenciária incidente, consoante disposição expressa do artigo 43 da Lei nº 8.212/91.

Em atenção ao disposto no artigo 832, § 3º da CLT, pontua-se que integram a remuneração para fins de cálculos dos valores devidos à Previdência Social os reflexos das comissões no DSR e diferenças de gratificação natalina.

A reclamada deverá ainda proceder ao recolhimento da contribuição previdenciária incidente sobre os salários pagos no curso do contrato de trabalho, resultante da diferença entre o salário reconhecido nesta sentença e àquele anotado na CPTS do obreiro.

As demais, dada a natureza jurídica indenizatória, estão isentas de recolhimento, nos termos do artigo 28, § 9º da Lei n.º 8.212/91.

As contribuições previdenciárias deverão ser calculadas mês a mês, observando-se os limites de isenção fiscal.

A reclamada deverá promover e comprovar os recolhimentos previdenciários incidentes, sob pena de execução do valor respectivo, nos exatos termos em que determinado pelos artigos 114, § 3º da Constituição Federal e 876, parágrafo único da CLT.


7. litigância de má-fé
A reclamada pediu a condenação do reclamante em litigância de má-fé de modo a demonstrar que a Justiça do Trabalho não tolera quem utiliza torpeza para enganar, mentir, ludibriar, em busca de direitos que não lhe pertencem (f. 68).

Não verifico ter o reclamante praticado qualquer das ações descritas nos verbos utilizados pela reclamada. O autor pleiteou direitos que entendia devidos, alguns foram acatados, outros rejeitados.

A simples sucumbência não implica em litigância de má-fé.

Indefiro.


III – DISPOSITIVO
Diante do exposto, declaro a incompetência da Justiça do Trabalho para conhecer o pedido de indenização por danos materiais e morais decorrentes de acidente de trabalho; acolho a preliminar de inépcia do pedido contido a f. 07, aliena v; rejeito as demais preliminares aduzidas pela reclamada. No mérito, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na reclamação trabalhista movida por FULANO contra TRANSPORTES LIMITADA, para declarar a nulidade dos recibos de pagamento juntados aos autos e condenar a reclamada a retificar a CPTS do obreiro, bem como no pagamento das seguintes verbas:

a) reflexos das comissões no DSR;
b) diferenças de férias acrescidas de 1/3, gratificação natalina, aviso prévio indenizado, FGTS e multa de 40%;
c) devolução dos descontos de 5% sobre o valor do frete;
d) devolução da importância de R$ 400,00.

As condenações acima possuem como parâmetro os exatos termos da fundamentação, que passa a integrar este dispositivo para os efeitos legais.

A liquidação deverá ser procedida por simples cálculos. Juros e correção monetária na forma da lei.

Custas pela reclamada no importe de R$ 400,00 (quatrocentos reais) calculadas sobre R$ 20.000,00 (vinte mil reais) valor provisoriamente arbitrado à condenação.

Desta sentença as partes estão intimadas (Enunciado 197 do C. TST). Intime-se o INSS (art. 1 , da RA n. 047/2003).

Nada mais havendo a registrar, encerrou-se às ..h...

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